20061030

  • De silabas de letras de fonemas
  • se faz a escrita.Não se faz um verso.
  • Tem de correr no corpo dos poemas
  • o sangue das artérias do universo.
  • Cada palavra há-de ser um grito.
  • Um murmúrio um gemido uma erecção
  • que transporte do humano ao infinito
  • a dor o fogo a flor a vibração.
  • A poesia é de mel ou de cicuta?
  • Quando um poeta se interroga e escuta
  • ouve ternura luta espanto ou espasmo?
  • Ouve como quiser seja o que for
  • fazer poemas é escrever amor
  • a poesia o que tem de ser é orgasmo.
  • Ary dos Santos

20061029



Há dias, em que diariamente se amanhece assim,
Acasos de raridades raras e afins,
Em que entramos nos portões e passamos por porteiros,
Caminhamos por caminhos e gastamos dinheiros.

Acompanhados pelas companhias de guitarras
E pelas violas violadas, (pelos dedos) dedilhadas.
Cantamos canções cantadas e cansadas,
Bebemos bebidas de frutas esmagadas.

Somos felizes na felicidade de o ser,
Abraçamos abraços… de quem abraçar quiser.
Escrevemos escritos com penas de mulher
E rimos de sorrisos, que se amam sem saber.

20061024



Era o pintor, chegava a qualquer hora, porque para ele não importa o tempo, a causa dele chama-se inspiração e essa, não tem relógio – pelo menos que tenha horas certas.
Lá vai ele, rua abaixo, rua acima, uma flor aqui, uma varanda acolá, mais uma `arvore carregada de Outono… e o gato. Todos os quadros precisam de um gato na sua preta pose de altivez. Segue a espalhar …
Era o pintor, que pintava o tudo e o nada, enchia o vazio de cheio, olhava os que o olhavam e voltava a olhar em repetições certas marcadas pelos olhos.
Para eles, ele era o pintor. Para o pintor, elas eram a solidão. As pessoas. A razão.

Era o pintor, que escrevia palavras que eram desfolhadas no rés-do-chão das livrarias, por pessoas sedentas de ler sentimentos. Porque os quadros dele eram poemas. Prosas. Anedotas.
E ele olhava os que se saciavam e voltava a olhar em repetições certas, timidamente, marcadas pelo sorriso.
Para ele, elas eram a vida. Para elas, ele era o seu mágico. O refugio. O sabor.


Vemos tantas coisas
(Mais valia sermos cegos)
Filosofias baratas,
Que aumentam os nossos egos .
Nuvens de problemas,
Que tapam os céus abertos.
Ate vamos por caminhos
Que não sabemos se são certos


Deixa-me ficar aqui
Serve-me outro café e deixa-me ficar
Não me mandes embora
Senão parto sem destino...pela vida fora

20061023



Os mundos
Que se escondem em ti
Vagabundos
Que tu não deixas nunca partir
Sair do labirinto
Escapar às emboscadas da razão
Sentir bater o vento
E andar na corda bamba da solidão

Só tu sabes o que ainda te seduz
Só tu sentes o que poderá ser
Que te rasga, que te acende
E desata o nó
Para te deixar correr
Para te deixar correr

Mafalda Veiga in “Só tu sabes”

20061021


...posso?
...deixas-me?
...e´ só pousar a cabeça no teu coração,
enrolar os olhos na tua pele e
deixar a mão nos teus cabelos...
...e os lábios, posso manda´-los
encontrar os teus?

Obrigado!

20061018


Hoje posso ser
tudo o que quiseres
que seja;
tudo o que sonhares
que seja;
tudo o que pedires
que seja;

Só te peço uma coisa:
Não me deixes muito tempo.
...e´ porque esta´ a chover
e posso enferrujar

Posso mudar para castanho,
transformar-me em rugas ou,
pior ainda, ficar sensível e
quebrar-me no sítio errado

Depois posso ser
tudo o que quiseres
que seja;
tudo o que sonhares
que seja;
tudo o que pedires
que seja;

...mas em pedaços

enquanto me queres, sonhas e pedes,
talvez eu ainda consiga ser
o que quiser.
Basta quebrar no sítio certo!

Mas entre o que sou e o que serei e
entre o que queres que seja

...tentarei ainda ser EU!!!

20061016

Nao tenho sabor,
ela entra toca-me,
enrola e enrola,
desce e faz-me bem.
Mas nao a sinto.

Engasga-me,
deixa-me sem ar;
e o ar sem palavras;
e as palavras mudas,
que mudam sem sabor.

Nao tenho saber e
so me sabe a nada,a po´ e
`aquele po´, cheio de nada

A nada sabe
e nem eu sei.

Nao tenho sabor
e nem quero saber;

20061015


Sombra

Ali esta´
Parada a olhar para ti
Censura no mínimo deslize
Acção ao menor movimento

Sem sequer entrar luz no olhar
Não precisa, sente-la ali
Enrolado no lençol
No bate e rebate do bater coração

Pulsação a diminuir
Abrir um olho, depois outro
Mexer uma perna e outra
Um braço e outro

Era sonho
Descontrais
Relaxas
Moves lábios e sorris
E quando abres os olhos

Ali esta´

20061013


hoje eu quero ser eu.
quero fazer,pedir,
mostrar, porque
hoje eu quero ser meu.

amanha
vou acordar,
com os exageros do costume;
vou continuar a queimar,
com a lenha fora do lume

vou amanhecer
doa a quem doer,
com a vontade que sera imposta
pela, incessante, sede de resposta

nunca vira´ o bem para todos
mesmo que fiquem com todos os louros
das cabalas que inventam e mandam
e que eu rejeito

porque podem disparar balas
sobre mim;
podem virar palavras
sobre mim;
...eu nao irei ripostar

mas serao va´rios os consentimentos
ao se sentarem sobre os assentos.
mas eu, mesmo nao disparando palavras
sei falar bem de sentimentos.

20061008

ADEUS

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"Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo
menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio
e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.


Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo
em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo
em que os meus olhos;
eram realmente peixes verdes.
Hoje são
apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,

uns olhos como todos os outros.

gastámos as palavras.
Quando agora digo:
meu amor,
já não se passa
absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome

no silêncio do meu coração.

Não temos já nada
para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado
é inútil como um trapo.
E já te disse:
as palavras estão gastas.

Adeus. "
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É isto que eu procuro nas pessoas...a genuidade de saber dizer as coisas por outras palavras.Podem ler este poema de Eugénio de Andrade de 3 (três) + 1 (uma) maneiras diferentes:
1- O poema completo sem ligar às cores
2- Apenas o VERDE da relva
3- Apenas o AZUL do céu
+
1- Como vos apeteça

20061006

TRADUZIR-SE

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir-se uma parte
na outra parte-
que é uma questão
de vida ou morte
- será arte?

Ferreira Gullar

Serve este poema para me dar a conhecer,assim como à foto que ilustra este blog.
... a encerrar um capitulo de vida?
... a partir de hoje serei um novo homem?
Nada disso.Não pensem coisas...
...apenas porque me apeteceu.

20061004

Revolução

Revolução
Para o bem da Nação
Censura, hipocrisia
Metem medo
Até arrepia

Salazar sem poder
Agora é que se vai ver
Que ela mordia, sempre que podia
Mete medo
Até arrepia

Cravo vermelho na mão
Ou na boca de um canhão
Com água a saltar, para não murchar
“- Comecem cedo!”
Já se ouvia

Revolução dos cravos
Da República em flor
Continua tudo pior

Ouviram-se tiros
Sem corpos a tombar
Quartel-general
Revolução a começar

Evolução
Para o bem da Nação
Já se pode dizer, (antes não se podia fazer)
Meteu medo?
Alegria

O poder derrubado
Não é preciso estar calado
A dar atenção aos que falam do pé para a mão
Mete medo
Algumas coisas que dizem
Até arrepia
É hipocrisia a mais

Revolução dos cravos
Da República a nascer
O que se pode prever?